quinta-feira, novembro 23, 2006

Bons tempos não existem mais

É passado o tempo da indignação. A revolta resultante da censura não existe mais. Estudantes não vão mais às ruas apoiar o que acham correto, tampouco de caras pintadas pedindo explicações. Os tempos são outros. Estamos na era individual, onde os rebeldes não têm mais lugar em nossa sociedade.
Iniciar um texto dessa forma mostra bem o quão incrédulo estou com o sistema. Em um passado muito recente, o sentimento apaixonado e patriótico inflamado pela repudia a ditadura fez história. Páginas de livros contam o quão importantes foram os estudantes e quantos feitos foram realizados para mostrar toda a aversão contra a injustiça.
Hoje, ao abrir um jornal, qualquer que seja ele, é difícil encontrar uma nota que seja retratando alguma inquietude. No mais calórico dos atos, estudantes indignados com o aumento do preço das passagens de ônibus, voltam às ruas e pedem por aquilo que é de direito. Onde está o problema? Ao meu ver, está na cumplicidade que já não existe. Os pais de hoje, estudantes de ontem, lembram bem dos anos difíceis que viveram e sabem contar como mais ninguém a vergonha daqueles tempos. Os quilômetros de letras de música que foram escritas pelas mais diversos artistas, censuradas e boicotadas pela inquisição brasileira, são memórias de um tempo difícil e hoje ao cantá-las, os jovens não conseguem a sintonia que foi esquecida pelo comodismo.
“Aqui na terra estão jogando o futebol...” e continuam, pois o que mais interessa ao jovem de hoje é o placar reluzente informando a vitória do time de coração e a metáfora embutida na letra de nosso caro amigo Chico perdeu-se. Todo o processo que o país atravessou para enfim ter direito ao voto tem um valor acima daquilo que é estudado para as provas de vestibular. Os discursos inflamados de estudantes e políticos que tinham um sonho comum, evocados em palanques gigantescos ecoaram por todo o território em um grito comum – Diretas Já. As diferenças vieram com o passar dos anos, mas o prazer supremo retratado dentro do ser de todos aqueles que contribuíram de alguma forma para um Brasil mais justo é lembrança eterna, que debate algum será capaz de apagar.
Um comercial televisivo me fez pensar em algo que realmente faz sentido. No decorrer da performance cibernética da computação gráfica, um andróide ensina a forma de alcançar a eternidade – Basta fazer uma coisa notável para que você seja para sempre lembrado. É algo a se pensar. Foi, é e continua sendo um dos maiores temores do homem a morte ou ainda pior, o esquecimento após a morte. Estou divagando a respeito de um comercial, mas garanto que minha intenção não é a de fugir do tema. Pelo contrário. A intenção é a de marcar a ferro uma verdade incomoda que percebo nessa nova geração – o comodismo causado por essa falsa liberdade. Talvez Sartre, caso ainda fosse vivo, seria o melhor indicado para discursar a respeito dessa liberdade manipulada que nossa sociedade vive mergulhada. Uma liberdade guiada por programas de TV, por falsas notícias, por uma educação média, por políticos sem ideologia e pior, por desinteresse total norteado pela falta de fé.
Os Anos Dourados não podem ficar no passado dos livros. As grandes causas não podem ser atribuídas somente ao governo. Os sonhos deveriam voltar. O amor pelo país precisa transcender o orgulho esportivo. O interesse pela política nacional nunca deveria ter sido perdido e se foi um dia, está mais que na hora de ser resgatado.